Nova lei traz alterações relevantes para os estabelecimentos educacionais que lidam com crianças e adolescentes e passa a criminalizar o bullying e o cyberbulling no Brasil.
Sumário
Introdução
A Lei nº 14.811, de 12 de janeiro de 2024, foi instituída para incluir novas medidas com relação a proteção de crianças e adolescentes, inclusive alterando alguns dispositivos legais referente ao Código Penal, a Lei de Crimes Hediondos e ao Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA.
De início é importante frisarmos que a lei é direcionada a proteger crianças e adolescentes contra a violência nos estabelecimentos educacionais ou similares, ou seja, ela possui um aspecto amplo de abordagem não especificando apenas escolas ou redes tradicionais de ensino.
O grande objetivo desta nova lei é criar uma Política Nacional de Prevenção e Combate ao Abuso e Exploração Sexual da Criança e do Adolescente, que será elaborada em âmbito de conferência nacional e será executada por órgão federal.
Nesse sentido, o Poder Público passa a desenvolver, junto com órgãos de segurança pública e de saúde, além da própria comunidade escolar, protocolos específicos para medidas de proteção à criança e ao adolescente, contra qualquer forma de violência no âmbito escolar.
Há uma exigência expressa no texto legal acerca da necessidade em se incluir a capacitação continuada de todos os agentes públicos que atuam com crianças e adolescentes, principalmente envolvendo situações de violência sexual.
Novas formas de violência pela Lei nº 14.811/2024
Acerca do tema da violência, também é importante ressaltar que esta obteve 03 novos desdobramentos conceituais, sendo agora, além das violências já contidas anteriormente no Código Penal, a inclusão do artigo 146-A estabelecendo a intimidação sistemática (bullying) e seu parágrafo único com a intimidação sistemática virtual (cyberbulling).
Já a Lei dos Crimes Hediondos houve a nova redação do artigo 1º, inciso X, elencando o induzimento, a instigação ou o auxílio a suicídio ou a automutilação realizados por meio da rede de computadores, de rede social ou transmitidos em tempo real.
Desta forma, verifica-se que as relações virtuais, bem como as redes sociais estão completamente inseridas como ambientes de atenção para se garantir uma máxima proteção a criança e ao adolescente, chamando inclusive a atenção para os tipos de violência que podem acontecer nestes locais de forma ainda mais velada ou sorrateira.
O acréscimo do artigo 59-A no ECA
Com relação as alterações trazidas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) destaca-se o acréscimo do artigo 59-A, o qual prevê que instituições sociais públicas ou privadas que desenvolvam atividades com crianças e adolescentes e, ainda, recebam recursos públicos, deverão exigir e manter certidões de antecedentes criminais de todos os seus colaboradores, devendo ser atualizadas a cada 06 (seis) meses.
Continuando ainda no mesmo artigo, o seu parágrafo único prevê que estabelecimentos educacionais e similares, públicos ou privados, que desenvolvem atividades com crianças e adolescentes, independentemente de recebimento de recursos públicos, deverão manter fichas cadastrais e certidões de antecedentes criminais atualizadas de todos os seus colaboradores.
Assim, a Lei nº 14.811/2024 passou a instituir diversas novas obrigações legais para estabelecimentos educacionais, em sentido amplo, para proteger as crianças e adolescentes, impactando não somente na execução das atividades de educação, mas inclusive reverberando no tratamento de dados pessoais.
Com a exigência de que estabelecimentos educacionais tenham e mantenham certidões de antecedentes criminais de todos os seus colaboradores, estamos falando em um novo tratamento de dados pessoais, que irá impactar não somente o estabelecimento em si, mas as relações internas entre os próprios colaboradores.
Aqui é importante entender que o texto legal diz expressamente “todos colaboradores”, isso significa que o antecedente criminal não deverá ser exigido somente daquele colaborador que tiver um contato mais próximo da criança e do adolescente, sendo indiferente o cargo ocupado.
Da mesma forma, presume-se que colaboradores que tenham antecedentes criminais na modalidade positiva tenham que ser afastados de seus cargos e substituídos por aqueles que não o tenham, com o objetivo de proteger a integridade das crianças e dos adolescentes.
Com relação a este fato em específico surge a questão e a dúvida sobre como se daria o egresso e a ressocialização de pessoas que já tiveram antecedentes criminais positivos quando o assunto é o ambiente escolar envolvendo crianças e adolescentes; como é um assunto delicado e o texto legal não aborda nada de forma profunda, devemos aguardar as interpretações pela doutrina e a jurisprudência, mas é um fato interessante para se refletir e analisar.
É importante destacar que a exigência dos antecedentes criminais aos colaboradores não se trata de uma escolha dos estabelecimentos educacionais, mas agora de uma imposição legal, ou seja, cria-se um novo tratamento de dados pessoais, com a utilização da base legal do cumprimento de obrigação legal ou regulatória pelo controlador (artigo 7º, II da LGPD – Lei nº 13.709/2018).
Considerações Finais
Dada a publicação recente da referida lei, este passa a ser um assunto ainda muito novo em nosso ordenamento jurídico, razão pela qual não é possível abordar outros pontos mais específicos, mas fato é que tal legislação abarca os estabelecimentos educacionais de forma ampla, inclusive adotando a expressão “e similares”, não distinguindo por formas de ensino (se escola, creche, espaço kids, etc), tampouco diferenciando entre estabelecimentos da rede pública ou da rede privada, levando a crer que todas as instituições que são voltadas para a educação de crianças e adolescentes se atentem para essas obrigações legais.
Tendo em vista que estamos ainda no momento de férias escolares, mas que logo começará o momento de volta às aulas, elencamos as principais obrigações instituídas pela referida lei e que devem ser adotadas por estabelecimentos educacionais, sendo:
Adotar medidas de prevenção e de combate à violência contra a criança e o adolescente, com amparo do Poder Executivo Municipal;
Participar do desenvolvimento dos protocolos para estabelecer as medidas de proteção à criança e ao adolescente contra qualquer forma de violência no âmbito escolar;
Promover a capacitação continuada do corpo docente, integrada com a informação da comunidade escolar e da vizinhança em torno de todo o estabelecimento escolar;
Sendo instituição educacional da rede pública ou privada que receba recursos públicos deverá exigir e manter certidões de antecedentes criminais de todos os seus colaboradores, as quais deverão ser atualizadas a cada 06 (seis) meses;
Sendo instituição educacional da rede pública ou privada que desenvolva atividades com crianças e adolescentes, independentemente de recebimento de recursos públicos, deverá manter fichas cadastrais e certidões de antecedentes criminais atualizadas de todos os seus colaboradores.
Portanto, para manter o seu estabelecimento educacional em conformidade com esta legislação e outras correlatas sempre indicamos instituir um programa de compliance na sua instituição, pois esta é a forma mais eficaz de proteger o seu negócio e de trazer mais segurança jurídica para os seus colaboradores e seus alunos.
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Taís Castro - Advogada e Consultora em Proteção de Dados.
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